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sexta-feira, 7 de outubro de 2011

moral na sociedade humana e rural


1.1 - INTRODUÇÃO

Moral é um conjunto de regras no convívio. O seu campo de aplicação é maior do que o campo do Direito. Nem todas as regras Morais são regras jurídicas. O campo da moral é mais amplo. A semelhança que o Direito tem com a Moral é que ambas são formas de controle social.













































1. 2 - A MORAL NA SOCIEDADE HUMANA E RURAL

A moralidade da sociedade contemporânea assume hoje uma dimensão inversamente proporcional à sua visibilidade discursiva. Parece que quanto mais se fala em ética e moral, mais escandalosamente imorais se tornam as práticas. O discurso moralizante nasce, de um lado, da justa revolta das vítimas da barbárie moral e, de outro, do cinismo dos protagonistas da imoralidade. Comum aos dois aportes é a tendência de culpabilizar os outros, sejam eles indivíduos, grupos ou instituições. No presente trabalho, quero defender o ponto de vista de que a barbárie moral que vivemos não se explica nem se soluciona culpando o outro e exigindo que ele mude seu comportamento. As raízes da imoralidade são muito mais profundas e alcançam o terreno comum da tradição e da cultura. Por isso, entendo que a superação da barbárie moral não pode ser alcançada mediante intervenções e sanções tópicas, locais, superficiais, mas que é necessário um repensar amplo e corajoso dos arquétipos de nossa cultura, no que se refere aos conceitos de cidadania, democracia, justiça social e espaço público. Tal projeto deve relacionar a nossa tradição cultural e os valores a ela inerentes com o contexto moralmente perverso do modo de produção capitalista neoliberal que nos governa no momento. As perplexidades e ambivalências ético-morais precisam ser entendidas e analisadas a partir da confluência das características e tradições de nossa cultura com o modo de produção e os referenciais e representações ético-morais que lhe são próprias. Estes dois aportes – a tradição cultural e a realidade econômico-política – representam as vertentes cínicas das quais nasce a imoralidade que barbariza nossas relações sociais. Imoralidade essa que ora gera revolta, ora não provoca mais que indiferença e conformismo.
Os amplos traços desse cenário assumem contornos mais nítidos se focarmos o olhar sobre alguns aspectos mais tópicos. Assim, apesar de todas as promessas e expectativas de progresso e de solução dos problemas humanos, formuladas no início da modernidade (Kant, 1969), uma grande parte da população mundial continua faminta, analfabeta, doente e moribunda. Isso ocorre num momento em que já existem os recursos técnicos e econômicos suficientes para reverter esse quadro. Após o "desencantamento" do mundo medieval (Weber, 2005, p. 49), ordenado pelo modo divino, a modernidade assume a instituição da ordem como criação humana. "A existência é moderna", diz Bauman, "na media em que é produzida e sustentada pelo projeto, manipulação, administração, planejamento" (1999, p. 14). Foi no interior desse projeto que germinou a profunda ambivalência entre o avanço científico-tecnológico que ensejou a abundância de bens culturais e materiais e a miséria, o atraso, a carência de milhões de pessoas. Dessa condição fundante de exclusão que, para muitos, é inerente ao sistema político/econômico vigente, decorre a pergunta a respeito da natureza moral desse sistema.
A contradição entre a abundância e a miséria gera um ambiente de barbárie que violenta as relações em todos os espaços da vida: na família, na escola, nas ruas, nas empresas, nas relações internacionais. Em todos esses âmbitos observa-se uma incrível banalização da vida porque a vida é demais. A partir da modernidade, a plenitude da vida já não deveria ser buscada na transcendência, mas na imanência. Ora, se o sentido da vida se esgota na felicidade terrena e se esta não puder ser alcançada senão por alguns, a vida (pelo menos para muitos) perde o sentido e não merece ser respeitada como valor.
A falta de trabalho exclui multidões da atividade laboral, que é precisamente o processo constituinte do ser humano (Pochmann, 2004). O desemprego fere o homem em sua essência, pois agride a humanidade do ser humano, impedindo-o de participar condignamente da construção de sua própria identidade. Ironicamente, o autor do desenvolvimento e do progresso é excluído e condenado a uma violenta e agressiva competitividade que não só legitima a agressão e a eliminação do outro, mas se transforma numa das mais excelsas virtudes do nosso tempo.
A agressão ao meio ambiente gera uma vulnerabilidade de proporções inusitadas que ameaça a sobrevivência da própria humanidade. A poluição da água, do ar e da terra, bem como a poluição visual, a sonora e a olfativa, são, todas elas, conseqüência da intervenção irresponsável sobre o meio ambiente, que pode ter efeitos terminais, conforme alertam os cientistas de todo o mundo. O mesmo se aplica à manipulação genética, ao uso de hormônios, ao emprego de insumos químicos, visando o lucro rápido sem considerar as conseqüências de longo prazo.
As doenças, epidemias, vírus, gripes se disseminam vertiginosamente pelos caminhos rápidos (até mesmo eletrônicos) que ligam povos e culturas. Os que dispõem de recursos constroem barreiras, criam anti-vírus, conseguem proteger-se, enquanto os demais definham, morrem. Parece claro que os frutos do trabalho social, materializados no conhecimento, favorecem mais a uns e menos a outros.
A vergonhosa onda de corrupção que se abate, cínica, perversa e espetacularizada, sobre o espaço público, gera uma reação de repúdio talvez sem precedentes no país. Para além dos casos específicos de imoralidade pública, aparece no horizonte a ameaça da falência das instituições sociais ante o fenômeno de miscegenização entre o público e o privado, que ameaça os próprios fundamentos do estado de direito.
Resumindo estes itens, aos quais poderiam ser acrescentados tantos outros, pode-se dizer que estamos vivendo um domínio sem precedentes da razão instrumental e utilitarista (Adorno, 1985), para a qual os fins justificam os meios. Conceitos como eficiência, eficácia, lucro, domínio e vantagem assumem posição central nas relações humanas da sociedade contemporânea. O princípio da performatividade, do bom funcionamento, torna-se o critério de avaliação das ações individuais e coletivas. Com isso, a sociedade capitalista neoliberal assume diretrizes morais que invertem o imperativo da ética kantiana, não apenas permitindo, mas condicionando o bom funcionamento do sistema ao uso do homem como meio.





São esses cenários preocupantes e desoladores que provocam esta verdadeira explosão do debate moral que ecoa o tempo todo nas famílias, nos espaços políticos, na Igreja, na universidade e na escola. A grande pergunta que se coloca ao homem e à sociedade contemporânea, do ponto de vista moral, é como encontrar uma resposta à pergunta: O que significa 'tu deves'? Em outros termos, como podemos encontrar novos fundamentos para o dever.
Se, na condição de educadores morais, dissermos ao aluno 'tu deves' e ele perguntar 'porque devo', qual a resposta que lhe daremos? Os gregos argumentaram que 'devemos' por causa do Bem e da destinação natural do homem para o Bem. Os cristãos medievais acreditaram que 'devemos' por mandato de                                                                                     Deus. Os modernos argumentam que o dever se baseia na razão. Desde então, as respostas são muitas e variadas. De modo geral, associa-se o dever à condição de sobrevivência ou à conquista da felicidade. Mais recentemente, os pós-modernos (Lyotard, 1985; Lipovetsky, 1989; Bauman, 1997; Vattimo, 1996) anunciam o fim do dever nos moldes tradicionais e proclamam que as formas de comportamento devem ser decididas no contexto, nas circunstâncias.
Esta resposta se relaciona à natureza da sociedade contemporânea que se encontra em rápidas transformações; uma sociedade em que tudo o que é estabelecido logo se desfaz; uma sociedade em que tudo se centra nos interesses do indivíduo; uma sociedade em que o privado se sobrepõe ao público; uma sociedade em que as possibilidades de influência e manipulação da natureza, do ser humano e da vida assumem dimensões assustadoras.
São essas perplexidades que estão na raiz da grande visibilidade que alcança o discurso moral hoje. As pessoas sentem-se órfãs de parâmetros de comportamento. Os mais jovens, vivendo o espírito da época, são contrários a qualquer tipo de autoridade. Os adultos sentem-se inseguros, des-autorizados, sem saber o que dizer aos jovens. Serão corriqueiros o assombro e a desorientação das pessoas diante do futuro da sociedade se prosseguirem as práticas que afrontam qualquer sentido de bem comum, de justiça social. Por vezes, as pessoas parecem cansadas de lutar por uma sociedade melhor diante das dimensões assustadoras da barbárie; preferem desistir, encerrar-se na sua privacidade, abandonar o político, desestimuladas pela sensação de impotência perante as intermináveis séries de abusos que se sucedem diante de seus olhos. Embora seja compreensível, essa atitude encerra o grande risco de deixar o campo livre para que as contravenções sejam toleradas como uma rotina inevitável, contra a qual não há o que fazer. Penso que a luta em defesa de uma sociedade livre e justa não pode ser abandonada e acredito que à educação cabe um papel importante nessa tarefa.





1.2.1 - Quais os objetivos da educação moral?
Como já foi dito anteriormente, o modelo de um ordenamento moral de princípios e de regras estáveis pertence ao passado. Hoje, tudo está em permanente tansformação: o que valeu ontem pode não valer hoje e o que vale hoje pode não servir amanhã; o que é tido como certo num determinado contexto cultural pode não ser correto em outro. Impõe-se o entendimento de que os princípios e as regras universais perdem sua força a favor de novas convenções, que dependem dos contextos culturais. Pode-se dizer que se ampliam e flexibilizam os limites dos sentidos e, com isso, os limites do sujeito e do mundo. Como na arte, a vida parece ser uma permanente renovação de regras e de preceitos.
O contexto contemporâneo de paulatina desconstrução dos valores e normas tradicionais exige outras formas de legitimação. Pressupondo, como parece plausível, que os homens não conseguem conviver pacificamente sem normas que regulamentem suas condutas e sabendo, também, que tais normas não podem ser deduzidas de princípios transcendentais, é necessário dar-lhes legitimidade com base em outro procedimento. Já no início da época moderna, Rousseau (2007), Hobbes (2006) e Hume (1995) propuseram a idéia do contrato social. Mais recentemente, Habermas (1989) e Rawls (1993) sugerem a idéia de consenso a ser encontrado mediante o diálogo. Este novo procedimento de legitimação tem consequências consideráveis tanto para o sujeito que simplesmente cumpre normas, quanto para aquele que exige o cumprimento de normas. Para o primeiro não é suficiente obedecer cegamente às normas, porque, desde a modernidade, o sujeito moral assume a corresponsabilidade pela legitimidade das normas. Se, na moral tradicional, Abrahão podia matar seu filho sem incorrer em crime porque obedecia a Deus, a partir da modernidade, mesmo obedecendo a Deus, Abrahão seria criminoso, porque o argumento da autoridade não mais o isentaria da responsabilidade pelo homicídio. De outra parte, para o educador não é suficiente exigir obediência em nome de alguma autoridade: ele precisa tornar plausível a legitimidade das normas. No primeiro caso, é necessário responder à pergunta em nome de quem se obedece e, no segundo, em nome de quem se exerce a autoridade moral. Exige-se, portanto, um elevado nível de consciência e de responsabilidade. Hoje, é necessário dar voz à vida do indivíduo e da comunidade em meio ao calor e à fragilidade da realidade. A linguagem evocativa é substituída por uma linguagem palpitante, que tenta dizer o que nunca foi dito, que busca abrir trilhas em meio a cenários nunca antes visitados. A todo instante mudam os cenários na biologia, na medicina, na genética, na comunicação, na política, na economia, gerando sempre novos desafios para a reflexão ética e, consequentemente, para as decisões e ações morais.
Esse deslocamento dos fundamentos da moralidade do céu para a terra, da transcendência para a imanência, tem enormes implicações para qualquer projeto de formação moral. No bojo dessa reviravolta, ocorre a passagem da visão providencialista e fatalista da história para uma visão puramente humana e histórica. Com isso, dissolve-se a fonte que legitimava a educação moral tradicional e perde força o argumento da autoridade em nome do qual se exigia submissão e obediência. Encontramo-nos em meio a essa passagem, com os olhos ora voltados para o passado, ora para o futuro, entre a saudade e a esperança, vivendo intensamente as ambivalências de um mundo em transformação.
Ao tempo em que as mudanças ocorriam de forma mais lenta, o homem tinha condições de olhar para o passado e ver nele espelhados o presente e as expectativas de futuro, de modo que tinha como orientar-se, sentir-se seguro, em relação ao curso dos acontecimentos. Nesse contexto de estabilidade, justificava-se uma educação moral baseada no argumento da autoridade, que exigia sujeição e obediência ao conjunto de normas e valores aceitos por todos. A educação moral consistia na repressão dos desejos e instintos e na incoporação do ethoslegitimado pela tradição. Hoje, as tradições se encontram sob suspeita, perderam sua força orientadora e não oferecem mais amparo e segurança diante de um futuro inseguro e imprevisível.
Essa condição cultural tem decisivas conseqüências para a formação moral das pessoas. De um lado, como vimos, a educação moral nos moldes tradicionais da adaptação a um código ético de traços universais e permanentes já não é possivel. De outro, pela dissolução das referências, o homem corre o iminente risco de submergir na mudança, de ser envolvido, absorvido e levado pelo fluxo da existência, sem conseguir assenhorear-se do seu próprio caminho e destino. Para que isso não ocorra e para que não impere a lei do mais forte, são necessários códigos de conduta, normas e valores que devem ser respeitados por todos. É o preço da condição humana: a liberdade de todos exige o limite da liberdade individual. Apesar das teses que falam do fim dos valores (Lipovetsky, 1989), dos tempos líquidos (Bauman, 1999), as permanências, as referências, as normas e valores são condições necessárias da vida humana. Não há sociedade humana nem convivência ordenada e pacífica sem um código de direitos e deveres, orientador da coexistência dos indivíduos. O que ocorre é que este código não é mais indelével, permanente e universal, mas histórico, ou seja, sujeito a transformações e mudanças que acompanham as condições materiais e culturais da sociedade. Essa ambivalência entre a permanência e o fluxo, entre a tradição e o porvir, entre o ser e o vir-a-ser é o centro da paideia contemporânea.2
Nesse cenário, a tarefa da educação moral coloca-se numa nova perspectiva de formar um sujeito moral, portador de uma consciência crítica que lhe permita uma permanente percepção e avaliação da pertinência dos códigos, normas, tradições, na perspectiva da liberdade e da justiça. A liberdade é condição seminal de qualquer moralidade, uma vez que sem liberdade não há decisão nem ação moral, e justiça é condição antropológica do ser humano como ser social, que precisa encontrar formas de convivência em que direitos e deveres se equilibrem. Por isso, formar sujeitos morais não significa, pelo menos não significa apenas, transmitir esse ou aquele valor, exigir esse ou aquele comportamento, mas contribuir para tornar o indivíduo um sujeito crítico, político, reflexivo. Compete ao professor despertar nos seus alunos o desejo de ser um sujeito moral. Esse é fundamentalmente um processo dialógico, argumentativo, de convencimento. Ninguém pode obrigar alguém a ser um sujeito moral contra a sua vontade, nem mesmo mediante as mais severas ameaças ou sanções, pela simples razão de que a liberdade é condição sine qua non da moralidade. Obedecer às normas, seja por conforto ou temor, é condição suficiente para ser correto (em conformidade com as normas), mas não para ser um sujeito moral. A ação moral tem como pressuposto a livre escolha do sujeito. E essa condição de sujeito moral autônomo não existe a priori, nem pode ser simplesmente transmitida pela educação: é uma condição que deve ser conquistada e continuamente fortalecida ao longo de toda a vida. Ajudar nesse intuito é o sentido e o objetivo da formação moral.
Erigir liberdade e justiça em princípios centrais de um novo modelo de moralidade implica repensar profundamente a relação entre individuo e sociedade, estabelecendo novos vínculos que agregam as tônicas fundantes dos modelos ético-filosóficos da antiguidade e da modernidade, focados, como se sabe, respectivamente, na justiça e na individualidade. Sociedade e indivíduo são as duas faces imbricadas de uma mesma realidade social.
O ser humano, por ser dotado de razão, é um ser confiado a si mesmo, que deve cuidar de si, velar por si mesmo. Dessa premissa ele não pode abrir mão, sob pena de deixar de ser humano. O sujeito moral só se constitui a partir do trabalho que faz consigo mesmo como exercício de conquista de sua liberdade. O estado que o indivíduo deseja é o estado de soberania e independência de si mesmo, numa palavra, de autonomia com relação a si mesmo, às coisas e ao mundo. Desse objetivo maior decorre a pergunta a respeito da conduta ou das regras que devem ser assumidas para alcançar esse estágio de autonomia.
Combater a imoralidade significa, então, o homem repensar-se como sujeito moral; repensar-se como indivíduo, em sua história pessoal, nas suas relações com os outros seres humanos e com a natureza; significa repensar a sua situação no mundo contemporâneo, o sentido de sua vida presente e futura, as suas formas de convivência e usos dos outros e da natureza. Mas significa, também, repensar a sociedade, seus objetivos e ideais, seus valores e normas, seu sistema jurídico, político e econômico, na perspectiva da convivência digna e justa. E é no contexto dessa relação entre o individual e o social, como dimensões fundantes da moralidade, que o conceito de justiça adquire nova e inarredável centralidade. A justiça é a primeira e mais fundamental virtude do homem contemporâneo. O eixo dessa nova perspectiva consiste na relação indissolúvel entre o indivíduo e a sociedade. Restabelecer esse vínculo entre indivíduo e sociedade, em meio a um contexto cultural em que tal vinculação se apresenta estremecida, parece-me o objetivo central de educação moral. Não existe o sujeito moral independente da sociedade e nem a sociedade moral independente do sujeito moral: ambos mantêm entre si vículos indissolúveis de liberdade e de justiça. Liberdade é o escopo e justiça sua condição. Nesses termos, não há liberdade sem justiça e nem justiça sem liberdade.
Se fosse resumir essas considerações, diria que a educação moral se baseia, em termos de procedimento, no diálogo e na argumentação, e, em termos de objetivos, na formação do sujeito moral crítico, autônomo e livre, cujas principais virtudes devem ser a responsabilidade e a justiça. No entanto, a realização desse objetivo enfrenta, na prática, grandes dificuldades, uma vez que as tendências hegemônicas nos contextos sócio-cultural-econômico se orientam em sentido contrário. A seguir, serão apontadas algumas dessas dificuldades.








1.2.2 A MORAL NA SOCIEDADE RURAL
As discussões e análises da questão ambiental no campo são abordadas no contexto da reorganização do ambiente rural diante da sociedade globalizada. Nesse sentido, o tema da ruralidade apresenta-se mediante uma controvérsia que articula basicamente duas posições: uma aponta para o desaparecimento de um rural agrícola, face aos processos contínuos de urbanização e industrialização; outra, para a reconstrução de uma ruralidade que resgata um mundo da vida rural articulado com valores urbanos.
Para a primeira versão, o rural deixa de ser um espaço que privilegia a agricultura; é cada vez mais espaço de múltiplas atividades (SILVA, 1998; SCHNEIDER, 1999). A agricultura caminha para um processo de industrialização ou de um ramo de atividade industrial, de serviços em geral (GOODMAN, SORJ, WILKINSON, 199' SILVA, 1996). Nessa perspectiva, é possível deduzir que a terra perde importância como recurso produtivo à medida que a produção é realizada em ambientes construídos, como a produção de legumes e verduras em estufas, as granjas produtoras de aves, as fábrica-fazendas produtoras de leite. Desse modo, o rural é analisado na perspectiva da reorganização das atividades econômicas, onde o progresso tecnológico exerce um papel preponderante. Os recursos tecnológicos da informática e da engenharia genética estariam na ponta desse processo de transformação. Nesse contexto, o ambiente rural seria reconstruído na perspectiva de uma sociedade industrializada, onde as especificidades entre as atividades desaparecem, uma vez que a lógica da racionalidade técnico-instrumental seria determinante nos processos de reorganização social.
Para a segunda versão - o da reconstrução da ruralidade - o mundo rural não deixa de existir para a sociedade. Se por um lado ocorre um esvaziamento da população no campo à medida que a sociedade se industrializa, por outro, há uma reconstrução de relações sociais no meio rural mediante categorias sociais que permanecem no campo e que são valorizadas no contexto de políticas públicas (WANDERLEY, 2000). Assim, há um número majoritário de agricultores familiares, cujo processo de organização social e produtiva reconstrói relações sócio-ambientais que não se baseiam exclusivamente em valores urbanos. Antes, essas relações são reconstruídas com base em dois universos tensionados e complementares: o mundo da vida rural, expresso pelo cotidiano marcante das relações comunitárias no campo, e o sistema urbanizado, que através de relações de troca mediatiza valores universais com a sociedade. Nessa perspectiva, embora as comunidades rurais, os núcleos, povoamentos ou pequenas vilas ou cidades possam ser dotadas de infra-estrutura de lazer, energia, saneamento e serviços, com características dos centros urbanos, eles expressam um modo de vida que tem suas raízes no meio rural (WANDERLEY, 1999). Considera-se ainda que, nos chamados pequenos centros urbanos, atividades como as de serviços, agroindústria, turismo, ainda têm seus vínculos com a agricultura.
O ambiente rural é reconstruído mediante uma diversidade de atividades e com processos produtivos que combinam diferentes tipos de saberes (BRANDENBURG, 1999; WANDERLEY,1989). Ao combinar saberes diferenciados, os agricultores constróem relações com a natureza que retomam processos de gestão que fazem uso de recursos naturais e não necessariamente de recursos industrializados.
Na perspectiva do socioambientalismo, as duas correntes de interpretação do rural podem ser compreendidas na perspectiva da modernização ecológica ou na perspectiva da teoria crítica ou da modernidade reflexiva.
Sob o ponto de vista da teoria da modernização ecológica, uma infra-estrutura técnico-econômica renovada por um industrialismo ecológico fundamentaria o novo rural emergente.
Na perspectiva da teoria crítica da modernidade, a reconstrução do ambiente rural constitui a escalada de um processo de reencantamento do mundo, próprio da segunda fase da modernização (TOURAINE, 1994), ou da modernidade reflexiva (GIDDENS, BECK, LASH, 1997).
A reconstrução do rural no Brasil não se resume à reorganização técnica dos processos produtivos. O questionamento aos processos homogeneizadores da produção, em função de suas conseqüências sociais e ambientais, faz com que diversos atores sociais assumam posições críticas face à desestruturação dos ecossistemas e aos contínuos processos de exclusão social, de perda de identidade e massificação cultural. Paralelamente a esse processo, desenvolve-se uma consciência crescente, no interior da sociedade, dos riscos da tecnologia para a saúde humana e para o Bem Estar Social (BECK,1997). Isto faz com que a sociedade passe a consumir produtos e serviços que se aproximem de processos naturais e biológicos, tendo em vista possíveis conseqüências apresentadas por produtos industriais como os alimentos industrializados. É nesse contexto que hipoteticamente se poderia explicar o aumento por demanda de produtos orgânicos oriundos de uma agricultura ecológica.
Desta forma, dentre os vários temas relacionados com a questão ambiental no meio rural, a reorganização da agricultura, via agroecologia, parece ser um dos mais relevantes, considerando o seu sentido tanto para os atores sociais rurais como para a moderna sociedade de risco. Assim é possível afirmar que: se, para o consumidor, o consumo de produtos naturais representa uma alternativa de preservação da saúde, para o agricultor, a agroecologia, em expansão nesse momento, representa muito mais uma possibilidade de assegurar sua reprodução social do que uma ação fruto de racionalidade ecológica orientada por imperativos éticos de reconstrução de sistemas ecossociais.
A relação entre subsistência do agricultor e preservação ambiental, no Brasil, parece alavancar processos técnico-naturais de produção, o que não significa dizer que nesse processo não se forje atores sociais movidos por uma consciência ambientalista. Se há uma preocupação em restaurar processos produtivos que procuram gerir recursos naturais, é possível dizer que a preocupação com meio ambiente se amplie e, dessa forma, outros aspectos ambientais passem a ser considerados na reorganização da agricultura e do espaço rural.9 A diversificação das explorações e das atividades agrícolas, a conservação do solo e os cuidados com recursos hídricos e florestais, e com a paisagem, não apenas fazem do rural um espaço reorganizado de produção agrícola, como também um espaço de consumo ambiental. O rural ambientalizado oferece, além de produtos, uma natureza reconstruída própria para atividades turísticas, de lazer e outras, de mediação da sociedade urbana e industrializada.
Os vários temas do ambiente rural, assim como do ambiente urbano, do costeiro e outros, com a instituição dos Programas de Pós-Graduação em Meio Ambiente, passam a ser estudados sob a ótica da pesquisa interdisciplinar. Desta forma, os quadros analíticos não se resumem às ciências sociais ou naturais, mas cada área, em seu respectivo domínio, estabelece pontes de diálogo com as áreas relacionadas aos temas definidos como objeto de investigação. A abordagem interdisciplinar afirma-se como uma das mais promissoras para a compreensão de um rural em cujo espaço ainda se desenvolve uma das atividades produtivas mais próximos da natureza: a agricultura.
No que tange à abordagem das ciências sociais ou, mais propriamente, da sociologia, pode-se afirmar que os estudos de questões ambientais até agora realizados estão estreitamente relacionados com a sociologia rural, havendo ainda uma predominância desta nas investigações dos diversos temas agrários. Mas, à medida que a questão ambiental passa a ser considerada na reconstrução do rural, as teorias ambientais passam a contribuir nas análises das diversas dimensões dessa reconstrução.
A passagem de um quadro analítico para outro, nos estudos das questões rurais, foi muito bem resumido no contexto da sociedade francesa por MATHIEU E JOLLIVET (1989). No trabalho "Du Rural à L'environnement", os autores reúnem uma coletânea de textos que trata de temas ambientais diversos, na ótica de diferentes disciplinas, sugerindo um marco divisório na abordagem dos estudos rurais franceses. Para o caso brasileiro, assume-se a tese de que metodologicamente dois referenciais teóricos se complementam para uma melhor compreensão do rural que ressurge "ambientalizado": a sociologia rural e a sociologia ambiental. Por um lado, não se pode abdicar das abordagens clássicas da sociologia rural, dada a especificidade e a heterogeneidade social, ambiental e temporal do rural no Brasil. Ao mesmo tempo, negligenciar as contribuições de teóricos contemporâneos pode nos ocultar a compreensão de fenômenos de uma modernidade considerada como pós-industrial, crítica, reflexiva, ou de risco, que no caso brasileiro se sobrepõe a um tempo moderno ou até mesmo pré-moderno. Essas diferentes dimensões do real são relevantes não apenas para compreender como o rural se reorganiza mas, igualmente, para orientar atores sociais, organizações e instituições sociais e governamentais na formulação de políticas de desenvolvimento que articulem dimensões do ambiente e da sociedade.















2.3 CONCLUSÃO

Depois de algumas investigações sobre a moral na sociedade humana e rural conclui que a moral define o que é certo ou errado, justo e injusto, licito e ilícito, permitindo e proibido. Determina acções e atitudes que devem ser adoptadas pelas pessoas. Mas quem valida tais determinações e quais são os parâmetros utilizados para dar credibilidade aos deveres morais? A resposta poderia ser fácil; as colectividade. No entanto, cada coletividade comunga de ideais diferentes, o que faz várias morais coexistir no interior das coletividades.

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